Nenhuma instituição está habilitada para o serviço diacônico além da Igreja de Jesus Cristo. Só ela foi chamada e comissionada para servir ao mundo com poder e graça; só ela foi comprada e redimida; só nela existe a comunhão dos santos e só nela o evangelho é integral.
A igreja servidora e o ministério diaconal
A Igreja fundada por Jesus Cristo, de alguma forma, tenta imitar suas ações e seguir os seus passos. Como vimos acima, Jesus teve uma vida dedicada ao “serviço”, logo, exemplos de diaconia não nos faltam. Por isso, essa Igreja “invisível” e atuante no mundo tem como espelho o Mestre que diz: “Pois quem é maior: o que está à mesa, ou o que serve? Não é o que está à mesa? Mas eu estou entre vocês como quem serve (diácono)” Lc 22.27. Nessa passagem bíblica Jesus afirma ser como o escravo que serve à mesa.[1]
Com seu exemplo Jesus institui o princípio básico da ação de sua Igreja. Isso é fato comprovado em todo o NT. pois o que vemos em Atos e nas cartas é uma comunidade servidora que utiliza os dons em prol do próximo. Como afirma Brandt:
Na igreja que confessa: “Senhor é Jesus” existe a variedade e por intermédio desse Senhor, a unidade. Esse Senhor – como confessam todas as testemunhas – tornou-se servo e criado para a igreja, e isto significa: também para cada um pessoalmente. Ele coligou os membros da igreja para o serviço [grifo nosso]. Transformou a igreja inteira no instrumento de seu serviço ao mundo[2]
Dessa forma, fica claro que a única instituição comissionada a fazer diaconia é a Igreja. Por isso, o serviço diaconal não pode estar ligado a qualquer outra instituição, pois nenhuma outra é separada do mundo e dedicada ao Senhor, senão a Igreja.[3] É importante entendermos essa dimensão da Igreja, de que ela é nada mais nada menos do que a obra consumada e continuada de Cristo através das eras e gerações, portanto, podemos definir a Igreja como o domínio de Cristo sobre a terra.[4]
Como embaixadora desse domínio, a Igreja tem tarefas que vão além do anúncio das Boas Novas. Esse domínio tem como característica fundamental o serviço, a mordomia na/para a criação. E isso nos remete ao conceito da Imago Dei (Imagem de Deus). O livro de Gênesis declara que o ser humano não é um escravo dos deuses ou uma criatura qualquer, ele é Imagem e Semelhança de seu criador e isso trás para ele implicações éticas perante as demais criaturas e ao próprio ecossistema. Comento em meu livro:
Os grandes reis do Antigo Oriente costumavam mandar erguer nos seus reinos efígies (estátuas) de si mesmos. Elas serviam como símbolos de sua soberania, ou seja, onde fosse visto essa estátua, saber-se-ia que aquele território pertencia a tal rei. Foi nesse sentido que Israel compreendia a sentença imagem e semelhança de Deus, vendo o ser humano como símbolo da própria soberania de Deus sobre a terra (von Rad). Enquanto que para povos vizinhos, o ser humano não passava de escravo dos deuses, para Israel ele era, e é, cooperador de Deus na criação. Onde houver um ser humano, ali está um representante de Deus, basta ele se dar conta disso. [5]
Mesmo após a queda o ser humano continua sendo imagem e semelhança de Deus, contudo, com alterações, pois se nada mudasse com a queda, não haveria necessidade de conversão e regeneração. Mondim esclarece:
· Pelo fato de constituir um aspecto essencial do ser humano, a imago Dei nunca foi inteiramente destruída, nem totalmente corrompida, mas apenas deturpada, a tal ponto que, por si só, o homem não tem forças para restaurá-la.
· A restauração da imago Dei no homem é obra do Filho de Deus, que é imago Dei por excelência.[6]
Sendo assim, a Igreja é feita de pessoas regeneradas e que devem enxergar a diaconia na perspectiva da Imago Dei, logo, é ir além de dar comida e palavra para quem não tem, é serviço prestado em prol de toda a criação, é incentivar o cuidado com o meio ambiente e tudo que diz respeito a este, influenciar as políticas públicas para a promoção da vida etc.[7]
O assunto é muito amplo e não temos espaço para maiores explanações, mas cremos que isto ficou claro: é a comunidade de Jesus que tem a responsabilidade de viver diaconicamente!
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[1] Cf. SCHWEISER, Eduard. in: NORSTOKE, K. A diaconia em perspectiva bíblica e histórica. São Leopoldo: Sinodal, 2003. p. 53s.
[2] BRANDT, Wilhelm. in: NORSTOKE, 2003. p. 52.
[3] Cf. OFTESTAD, Alf B. Vivendo Diaconia: edificando a igreja através do cuidado pessoal e social. Curitiba: Encontro, 2006. P. 43.
[4] Cf. AULÉN, Gustaf. A fé cristã. 2. ed. São Paulo: ASTE, 2002. p. 271.
[5] AQUINO, Rodrigo de. Rascunhos da alma: reflexões sobre espiritualidade cristã. Joinville: Refidim, 2009. p. 44.
[6] MONDIN, Battista. Antropologia teológica: historias problemas perspectivas. São Paulo: Paulinas, 1979. p. 139.
[7] Isso não quer dizer que todos na Igreja devem fazer tudo. Deus distribui os dons e no seu corpo as vocações são distintas: Uns gostam de cuidar de idosos, outros não tem o mínimo jeito; uns gostam de envolver-se em questões comunitárias, outros não. O que queremos dizer é que a Igreja de Jesus deve estar envolvida em tudo que promove a vida e o cuidado com a criação.