Redenção

E se Deus chamasse alguém para em nome da paz e da esperança de algumas crianças, botar a mão na massa e nesse caso, não só na massa, mas também em metralhadoras, você acreditaria? Pois bem, por mais estranho e paradoxal que seja, essa é a vocação de Sam Childers, apelidado de Machine Gun Preacher […]



10 de julho de 2012 Bibotalk Reflexões

E se Deus chamasse alguém para em nome da paz e da esperança de algumas crianças, botar a mão na massa e nesse caso, não só na massa, mas também em metralhadoras, você acreditaria? Pois bem, por mais estranho e paradoxal que seja, essa é a vocação de Sam Childers, apelidado de Machine Gun Preacher ou Pastor Metralhadora, história real que você conhece um pouco no filme Redenção.

Na trama acompanhamos Sam, interpretado por Gerard Butler, abandonando as drogas, os furtos e tudo que envolve esse mundo, após ter um encontro com Deus. Sam logo percebe que fé é ação, e o que era para ser um trabalho voluntário na África acaba se tornando um envolvimento político no Sudão, onde rebeldes devastam vilas e recrutam crianças para sua causa. E a partir daí o bicho pega.

Sam decidi agir para ajudar essas crianças, correndo atrás de fundos, para a construção de um orfanato, e atrás de rebeldes, afugentando-os com sua metralhadora. Todo esse envolvimento gera crises familiares e de consciência, pois Sam acreditava ter deixado para trás sua natureza assassina.

Recomendo o filme, vale como diversão e também levanta umas questões interessantes, como chamado, capitalismo, prioridade, ética, família, etc.. Algumas delas passo a comentar abaixo, só lembrando, que esses comentários terão SPOILERS, então leia por sua conta e risco! Se já assistiu ao filme, junte-se a mim nos comentários, compartilhe sua impressão.

É interessante ver um cara que estava vivendo uma boa vida, afinal Sam tornara-se empresário, aceitar o desafio de fazer trabalhos voluntários na África, não ir lá somente bater fotos ao lado de crianças negras e colocar na internet, mas ajudar em construções e no que for preciso. E ainda por cima, querer se aprofundar nesse trabalho se envolvendo em questões políticas e perigosas. Esse desprendimento de Sam me lembrou dos primeiros discípulos, que se levantavam e seguiam o Mestre. É louvável ver um ser humano abandonando sua zona de conforto em prol de uma causa realmente relevante. Ele foi muito prático, seguindo uma lógica simples: precisam de mim e eu posso ajudar. Esse princípio pode ser aplicado a todos nós, talvez não tenhamos condições de ir à África, mas com certeza existe alguma necessidade no mundo compatível com meus talentos, logo, aí está o meu chamado.

Porém, na história do Sam existem alguns agravantes, pois ao atender de forma radical esse chamado ele deixa sua família em segundo plano, esposa, filha e amigo ficam desamparados, levantando a pergunta, seria isso necessário? Atender o chamado de Deus pra minha vida exclui minha família? Fora o fato dele vender seus bens para investir no orfanato. A princípio parece uma atitude nobre e bíblica, porém, penso que nossa família vem antes do nosso chamado. Deixa eu explicar. No caso do Sam, só ele estava com essa pegada de ajudar as crianças no Sudão, a família ainda não. E a ruptura na história dele foi muito radical. Penso que nossa família deve fazer parte do nosso chamado, com apoio e envolvimento. Sam hoje mora na África com as crianças e a esposa cuida da igreja que eles montaram nos EUA. Seria o ideal um casal viver assim distante um do outro, por causa de um chamado? Tenho minhas dúvidas…

Mas a principal questão que o filme levanta em minha opinião, é a atitude agressiva de Childers com os rebeldes, que são mortos ao tentarem recrutar as crianças e queimar suas vilas. Mesmo que seja, quem sabe, a única forma efetiva de enfrentar a situação daquele lugar, a postura de Sam viola diretamente o sexto mandamento (ouça nosso podcast sobre esse mandamento). Ele enxerga isso como ministério dado pelo próprio Deus. Algo parecido com o que os EUA fazem com seus inimigos, se julgando agentes de Deus para purificação da maldade. Essa postura até se encaixaria numa sociedade do Antigo Testamento, mas diante do NT, essa postura desmorona.

A situação é melindrosa, é verdade, afinal sem matar os rebeldes não tem como trazer paz e esperança para aquelas crianças, visto os acordos políticos não terem sucesso. O “ministério” do Pastor Metralhadora me lembrou dum grande teólogo do século passado chamado Dietrich Bonhoeffer que inconformado com as injustiças praticadas por Hitler, entra num movimento de resistência, tentando inclusive matar o Führer. Mas a diferença drástica entre os dois é que Bonhoeffer tinha consciência de que estavam praticando algo contrário as Escrituras. Para ele matar Hitler era uma coisa má, porém, um mal menor, comparado a todo mal que ele fez com os judeus e outros.

Enfim, não quero me alongar muito, mas estou ciente de que a discussão pode ir muito longe. Mas finalizo dizendo que acho errado o que Sam Childers faz, porém, se eu fosse uma daquelas crianças?

Se quiser conhecer um pouco mais do trabalho desse pastor, leia essa entrevista, clique aqui.